Enquete sobre a PEC tinha até este domingo (26) 17.718 votos contra e apenas 309 a favor
Uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Presidência da Câmara dos Deputados transforma áreas da costa marítima brasileira em áreasparticulares.
A PEC 03/2022 extingue os terrenos de Marinha no litoral – área que se estende 33 metros da maré mais alta ou das margens de rios e lagos – e privatiza, de graça, essas faixas de terras.
Ambientalista dizem que a PEC é um desastre. Assista:
A PEC será debatida em audiência pública na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado nesta segunda-feira (27). O relator do projeto é o senador Flávio Bolsonaro (PL-SP).
O projeto revoga o inciso VII do caput do art. 20 da Constituição Federal e o § 3º do art. 49 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias que estabelece o domínio da União sobre as faixas litorâneas.
Atualmente, a iniciativa privada precisa obter licença e contrapartida ambiental para qualquer empreendimento.
No portal e-Cidadania, do Senado, enquete sobre a PEC tinha até este domingo (26) 17.718 votos contra e apenas 309 a favor.
Apesar de a enquete do Senado mostrar que a ampla maioria não quer a aprovação da PEC, ela foi aprovada pela Câmara dos Deputados em 2022.
No artigo 1º, a PEC estabelece:
– Passam ao domínio pleno dos foreiros e dos ocupantes regularmente inscritos no órgão de gestão do patrimônio da União até a data de publicação desta Emenda Constitucional; I
Passam ao domínio dos ocupantes não inscritos, desde que a ocupação tenha ocorrido pelo menos 5 (cinco) anos antes da data de publicação desta Emenda Constitucional e seja formalmente comprovada a boa-fé;
– passam aos cessionários as áreas que lhes foram cedidas pela União.
Foreiros são terrenos cedidos pelo proprietário a terceiro, que passa a ter diversos direitos de propriedade.
Particulares
Para adquirirem a posse definitiva do terreno de marinha, foreiros e ocupantes particulares regularmente inscritos junto ao órgão de gestão do patrimônio da União poderão deduzir do valor a pagar o que já foi pago a título de taxa de ocupação ou de foro nos últimos cinco anos, atualizado pela taxa Selic.
No caso de ocupantes não inscritos, a compra do terreno dependerá de a ocupação ter ocorrido há, pelo menos, cinco anos antes da publicação da emenda e da comprovação formal de boa-fé.
O governo federal terá dois anos para efetivar as transferências.
De acordo com o governo, existem cerca de 500 mil imóveis no País classificados como terrenos de marinha, dos quais em torno de 271 mil aparecem registrados em nome de responsáveis únicos (pessoas físicas e jurídicas).
Adicionalmente, a União poderá ceder as áreas.
O ambientalista e ex-ministro do Meio Ambiente Carlos Minc classifica o projeto de “nefasto”. No X, ex-Twitter, Carlos Minc diz que “o PL acaba com a proteção ambiental da costa brasileira”. “Doa gratuitamente a posseiro e concessionário. Poderão cobrar, construir. Em tempo de mudança climática: SOS”, escreveu Minc.
Ambientalistas alertam que a zona costeira é fundamental para a proteção das cidades, da vida selvagem e modo de vida de uma boa parcela da população, especialmente a mais vulnerável. É o caso dos pescadores artesanais, pequenos comerciantes da praia e o turismo de base comunitária.
Outro temor é que sem o controle público, essas áreas se transformem em praias privadas e condomínios de luxo erando maior risco de desastres ambientais.
Pela proposta, o controle público será mínimo e se limitará às áreas afetadas ao serviço público federal, inclusive as destinadas à utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicos e a unidades ambientais federais, e as áreas não ocupadas. Também passam ao domínio pleno dos respectivos Estados e Municípios as áreas afetadas ao serviço público estadual e municipal, inclusive as destinadas à utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicos.
O GT-Mar (Grupo de Trabalho para Uso e Conservação Marinha), vinculado à Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso Nacional, alerta que os terrenos marinhos são estratégicos para adaptação às mudanças climáticas. A conservação dessas faixas é também fundamental para reduzir vulnerabilidade da zona costeira frente ao aumento do nível do mar.
Conforme o GT-Mar, uma possível aprovação da PEC significaria o crescimento exponencial de conflitos diante do “grande incentivo à invasão de terras públicas – urbanas e rurais – apenas pela sugestão de possibilidade de privatização dessas áreas”.