Em março, o avião da Voepass registrou problema hidráulico e contato anormal com a pista que provocou ‘dano estrutural’, deixando a aeronave 4 meses fora de operação
O avião que caiu em Vinhedo, São Paulo na última semana era uma verdadeira arapuca, mas a Anac diz que estava ótimo para voar.
A Agencia Nzcional de Aviação Civil sabia que a aeronave teve danos estruturais que inviabilizariam a utilização do avião, mas mesmo assim colocou a voda dos passageiros em risco e 62 morretam na hora, na tarde de sexta-feira (9).
tinha sofrido um dano estrutural recente
Problemas com ar-condicionado, falha no sistema hidráulico e contato anormal com a pista. Esses são apenas alguns dos problemas recentes pelos quais passou o avião turboélice modelo ATR-72-500 da Voepass antes de cair repentinamente na cidade de Vinhedo, no interior de São Paulo, que já sabemos.
A Anac simplesmente ignorou que a aeronave prefixo PS-VPB vinha enfrentando uma série de paradas para manutenção e nãodeveria estar em uso.
No dia 11 de março deste ano, o ATR da Voepas viajou de Recife para Salvador, e um relatório oficial descreveu problemas no sistema hidráulico durante o voo. Houve também um “contato anormal” da aeronave com a pista na hora do pouso. Esse contato anormal foi um choque da cauda do avião com a pista e essa batida causou um “dano estrutural” na aeronave, segundo foi relatado no sistema de manutenção da empresa.
Ou seja, a estrutura da aeronave ficou comprometida. Mesmo assim não houve nenhuma intervenção da da Anac.
Relatório aponta dano estrutural em aeronave ocorrido em março deste ano
A Anac não informa nenhuma decisão ou relato sobre o problema hidráulico.
Este tipo de problema em qualquer aeronave, seja um ATR, seja um boeing, seja um Airbus, é altamente significativo e deve ser reportado e avaliado, mas não há informações na Anac.
A Anac também não dispõe de informações sobre que tipo de correção foi efetuada pelo grupo Voepass na sua manutenção, para disponibilizar a aeronave a voo depois do dano estrutural nem do vazamento hidráulico.
A aeronave ficou parada em Salvador por 17 dias, até 28 de março, quando voou para passar por consertos na oficina da Voepass, em Ribeirão Preto (SP).
O avião só voltou a voar comercialmente no dia 9 de julho, mais de três meses depois. A primeira rota foi de Ribeirão Preto para Guarulhos, mas houve uma despressurização em voo no mesmo dia e o ATR retornou, sem passageiros, para Ribeirão Preto, onde ficou parado mais quatro dias para reparos.
No dia 13 de julho, finalmente a aeronave retomou as atividades, até que 26 dias depois, matar todos que estavam dentro da aeronave que caiu na sexta passada.
Um dia antes do acidente, a jornalista Daniela Arbex pegou o avião e fez um relato de que o ar-condicionado não estava funcionando. As pessoas tentavam se refrescar como podiam, e um homem chegou até a tirar a camisa por causa do calor.
“Eu fiquei muito angustiada diante daquela situação, porque eu pensei assim, se eles não são capazes de fazer uma manutenção adequada num simples ar-condicionado, será que esse voo é seguro?”, falou Arbex.
Formação de gelo nas asas
Outro ponto importante a ser analisado é a presença de gelo na rota. Outros pilotos que passaram pelo mesmo trecho naquele dia, enfrentaram esse problema.
As causas do acidente ainda vão ser profundamente investigadas, mas é natural que, no meio aeronáutico, ali entre os pilotos, tenha surgido com força a hipótese de acúmulo de gelo nas asas. primeiro porque o boletim de meteorologia de fato mostrava formação severa de gelo no trajeto.
Outro fator levado em consideração é que, 30 anos atrás, nos Estados Unidos, aconteceu um acidente muito parecido também com um ATR. Era um avião da American Eagle, que é uma subsidiária da American Airlines para voos mais curtos.
Neste caso, também houve uma queda brusca e as investigações mostraram que a causa era um acúmulo de gelo nas asas.
Em um voo de Indianápolis para Chicago, a investigação mostrou que o sistema que infla na parte da frente das asas para quebrar o gelo não conseguiu expulsar tudo. Com isso, o gelo que ficou foi o suficiente para derrubar o avião.
Para piorar a situação, um passageiro de um voo anterior da Voepas fotografou acúmulo de gelo nas asas do ATR. Ele viajou no voo 2282, entre Guarulhos (SP) e Cascavel (PR), última rota completa da aeronave antes do acidente. A foto foi tirada às 11h02.
“Eu tinha acordado, olhei para a janela e vi o gelo. Nunca tinha visto gelo assim em um avião. Isso não me assustou, mas me deixou impressionado, e pensei: ‘nossa, que perigoso, deve estar muito frio.’ “, disse o passageiro Rubens Souza, que fotografou a asacom gelo.
A hipótese de que nuvens tenham ontribuído para a queda do ATR 72
Veja, na arte abaixo, onde fica o sistema inflável:
Graças ao que se aprendeu nesse desastre, o sistema inflável passou a ocupar uma área maior das asas.
O sistema é uma proteção de borracha, tipo um balão que vai inflando e retraindo e quebra o gelo.
Entendendo o ATR
Esse tipo de avião é um turbo-hélice, uma classe que voa justamente nas altitudes onde o gelo costuma se formar.
É utilizado na aviação regional.
“As aeronaves voam em altitudes passiveis de formação de gelo em suas asas e outros pontos e possuem sistemas para evitar que isso seja um problema. Existem sistemas para derreter esse gelo.
São utilizados resistores que aquecem e não permitem congelar , ou, se formar o gelo, ele derrete. Os resistirem são geralmente colocados nos tubos de pitô, na entrada do motor, no para-brisa . O piloto, quando está indo para uma região passível de formação de gelo, ele liga esse sistema”, completa.
Outro ponto muito sensível é a asa. O acúmulo de gelo diminui a velocidade e, em consequência, a sustentação.
Se houver formação de gelo na parte frontal da Asa, a crosta modifica a aerodinâmica e é pode haver acidentes.
Além de tudo isso, há um recurso clássico: voar em altitude mais baixa e, para isso, não precisa nem esperar que o controle autorize.
Segundo a Aeronáutica, não houve pedido do ATR para voar mais baixo. E dados do site Flight Radar, que acompanha voos pelo mundo, mostram o avião nivelado a 17 mil pés, cerca de 5 mil metros. Pouco antes da queda, ele baixa para 16.700 pés e, de repente, volta para 17.200, quando inicia a queda no que os especialistas chamam de “parafuso chato”.
Na linguagem da aeronáutica, se diz que o avião entrou em stol, que é a perda de sustentação e depois caiu.
Todos esses dados técnicos se somam a informações sobre os métodos da empresa Voepass e também da antecessora, a Passaredo.
“Depois da pandemia, os tripulantes têm percebido níveis de fadiga ainda maiores. Os relatos mais recentes da Passaredo com relação à área de manutenção são por conta dos sistemas de ar-condicionado, que vinham apresentando algumas precariedades”, diz o diretor-presidente dos aeronautas, Henrique Haaklander.
Ex-comissário relata situação dos aviões da empresa
Um ex-comissário da empresa fez duras críticas à manutenção das aeronaves.
“A empresa colocava a segurança em segundo ou terceiro plano. Visava mais o lucro e a gente tinha um avião que apelidava de Maria da Fé, pra você ter ideia. Porque só voava pela fé. Porque não tinha explicação de como o avião daquele estava voando”, diz o funcionário que pediu para não se identificar.
JJJá um comandante fez questão de se identificar. O comandante Guardiola voou 15 mil horas nesse avião na Passaredo, em 2019. Ele nunca se esqueceu de uma situação inusitada justamente no botão que aciona o sistema antigelo.
“O problema foi detectado no nível de aquecimento de um dos sistemas. A solução encontrada pela manutenção foi a colocação de um palito de fósforo, ou sei lá, um palito de dente. Eu vi com esses olhos que a terra há de comer”, conta.
É sempre importante lembrar que as investigações sobre o desastre em vinhedo ainda estão no começo e que novos dados, principalmente das caixas pretas, podem mudar o rumo das apurações. Mas, por enquanto, o que se sabe é:
- Por algum motivo técnico, os pilotos não perceberam o acúmulo do gelo na asa e seguiram voando na mesma altitude até perder a sustentação;
- Os pilotos perceberam o acúmulo de gelo, mas os procedimentos seguidos não resolveram e o avião perdeu a sustentação;
- Além da questão do gelo, pode ter havido algo relacionado ao “dano estrutural” que os mecânicos detectaram em março passado.
“Eu queria encorajar todo mundo que já passou pela empresa a poder relatar, para poder evitar que alguma outra coisa possa acontecer no futuro. Tem muita negligência com a segurança”, diz o ex-comissário da empresa.
“Ali os pilotos eram passageiros. Eu tenho certeza absoluta que eles caíram, morreram lutando. Eles morreram tentando fazer o que podiam fazer”, conclui Diego.
A Voepass Linhas Aéreas disse que informações relacionadas à investigação serão restritas à Aeronáutica e outras autoridades.
Sobre o dispositivo antigelo e o ar condicionado, a companhia afirmou que o ATR estava “aeronavegável”, com todos os sistemas requeridos em funcionamento, cumprindo requisitos e exigências das autoridades.
A Voepass disse que cumpre e respeita as legislações trabalhistas, e que o esforço principal da companhia, neste momento de dor, está em apoiar e dar assistência às famílias dos passageiros e tripulantes que estavam a bordo