Por Victório Dell Pyrro
Brasília – Em um episódio que rivaliza com roteiros de comédia política, a Câmara dos Deputados resolveu, com a determinação de um gato sonolento despertado por barulho de lata, cobrar explicações do Planalto sobre declarações da primeira-dama do Brasil Rosangela Lula da Silva, a Janja, a respeito de redes sociais. Aparentemente, bastou uma frase da esposa do presidente para gerar uma comoção digna de novela mexicana entre parlamentares que, até então, vinham enfrentando a dura rotina de não fiscalizar quase nada.
Na comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CREDN), os deputados subitamente lembraram que existe um negócio chamado “função de fiscalização do Legislativo” – e, num raro momento de lucidez institucional, aprovaram um requerimento endereçado ao ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa. Porque, claro, se tem alguém que adora responder por falas alheias, é o Rui Costa.
Tudo começou quando Janja, que aparentemente trocou o título de “primeira-dama” por “porta-voz oficial da moderação digital com tendências geopolíticas”, deu declarações favoráveis a um controle de conteúdos no TikTok. A confusão começou aí. Como quem não entende se aquilo foi um comentário de influencer preocupada com fake news ou um spoiler do que vem por aí, a Câmara reagiu com um vigor que não se via desde o último buffet gratuito.
Importação Made in China – versão censura deluxe
O grande temor dos parlamentares é que o Brasil esteja flertando perigosamente com o modelo chinês de controle da internet — aquele em que você pode acessar o TikTok, mas só se estiver disposto a ver vídeos aprovados por um comitê de contentamento ideológico. A comissão achou prudente lembrar que a China bloqueia Facebook, Instagram, X (o ex-Twitter, ainda traumatizado com a mudança de nome), YouTube, WhatsApp e até o TikTok “gringo”. Ou seja, só sobra a rede social local para fazer dancinha patriótica aprovada pelo Partido do governo chinês.
“Importar esse modelo seria um desastre democrático”, bradaram os deputados paladinos da liberdade de expressão. O medo, dizem, é que essa brincadeira de censura acabe mirando — veja só que surpresa — perfis conservadores, bem ali no horizonte de 2026. Afinal, nada como uma pitada de pânico eleitoral temperada com geopolítica sino-brasileira.
Janja: ministra do TikTok?
A pergunta que não quer calar — pelo menos entre os poucos deputados que abriram o e-mail da pauta — é: as declarações de Janja representam uma diretriz oficial do governo? E se sim, será que já devemos começar a chamar ela de Ministra da Moderação Digital? Ou será que Rui Costa agora acumula mais esse cargo no seu já apertado currículo de “responde tudo que ninguém quer responder”?
Timidez parlamentar: entre a indignação e o cochilo
A ironia maior talvez esteja na súbita energia da Câmara para cobrar explicações de uma fala inoportuna, sem respaldo institucional e informal, enquanto muitos deles tratam as ações reais do Executivo com a delicadeza de quem maneja porcelana chinesa. Há quem diga que essa comoção toda não passa de uma rara tentativa de parecer bravo em ano ímpar. Já outros sugerem que tudo é um enorme desvio de foco – porque nada une mais o Congresso do que um inimigo.
De qualquer forma, comissões foram mobilizadas, papéis foram carimbados, e agora se espera que Rui Costa venha dizer que, não, o Brasil não será uma filial do “Grande Firewall” chinês. Pelo menos, não oficialmente. E, com sorte, os deputados voltam ao conforto habitual da omissão seletiva, agora com o alívio de quem tentou, ainda que simbolicamente, exercer sua função constitucional de fiscalização.
Enquanto isso, Janja segue firme, postando nas redes sociais – mesmo que sem mandato, sem cargo, e sem a menor ideia de que virou protagonista de uma crise diplomática caseira e saia justa com Xi.
Ao conceder entrevista coletiva, em Pequim, naquela semana, o presidente Lula demonstrou irritação com o vazamento da gafe diplomática cometida pela primeira-dama, durante reunião privada com o ditador chinês.
Segundo os relatos, Janja teria dito diretamente ao líder chinês que o algoritmo da plataforma TikTok favorece conteúdos da direita. Xi Jinping teria respondido dizendo que o Brasil tem o direito de regular ou banir o TikTok.
Lula também disse que traria um especialista chinês para ajudar a regulamentar a Internet no Brasil, resta saber se o cala boca nas redes será a Lá Xandão ou por decreto presidencial encaminhado pela ministra do TikTok.

