Estatais bancam eventos com Lula — mas claro, tudo “estrategicamente”

Governo justifica dizendo que são objetivos estratégicos” das empresas públicas

Por Victório Dell Pyrro

É só coincidência, gente. Estatais federais e entidades do Sistema S resolveram, por livre e espontânea vontade (e zero ingerência política, como jura o governo), patrocinar uma série de eventos que — veja só! — promovem o presidente Lula (PT), dão palco pra ele discursar e ainda ajudam a cumprir promessas de campanha do terceiro mandato. Tudo alinhadíssimo com os “objetivos estratégicos” das empresas públicas. Um luxo.

Um levantamento da Folha de São Paulo publicado nesta terça-feira (27) mostra que entre os agraciados pelos cofres públicos estão reuniões e conferências queridíssimas do presidente, que ele adora citar como exemplo de aproximação com a sociedade civil e os movimentos sociais — ou, como diria um publicitário sincero, marketing de raiz. Um destaque? A glamourosa ExpoCatadores, onde os catadores de recicláveis ganham holofotes e Lula ganha aplausos.

Em 2023, esse evento sustentável e politicamente engajado foi agraciado com R$ 200 mil do BNDES, R$ 300 mil da Caixa, R$ 450 mil de Itaipu, R$ 250 mil do Sebrae e mais R$ 250 mil do Sesi. Não se pode dizer que o governo não recicla recursos públicos com entusiasmo.

O evento rolou de 20 a 22 de dezembro em Brasília, e claro, no último dia, Lula marcou presença no tradicionalíssimo “Natal dos Catadores”, onde — surpresa! — foi ovacionado com gritos de “viva o presidente” e tratado como a última esperança da democracia. No fim, como não poderia faltar, fez aquele discursinho básico.

“Estamos apenas repondo no lugar o que já estava e foi tirado”, disse Lula ao criticar as decisões tomadas pelo governo anterior como numa forte campanha política bancada com nosso dinheiro. “Esse é um primeiro passo de uma caminhada longa para vocês que sejam transformados em cidadãos plenos. O povo brasileiro está participando da reconstrução deste País, que foi desmontado.” Alfinetou ou esfaqueou as ações de seu principal adversário político.

Já em 2024, Lula estava de molho se recuperando de uma cirurgia (hemorragia intracraniana, nada leve), então não pôde aparecer. Mas foi homenageado com um vídeo cheio de boas vibrações — e sim, o evento seguiu firme com patrocínios: Sebrae (R$ 401 mil), Caixa (R$ 300 mil), Itaipu (R$ 200 mil), Correios (R$ 150 mil), BNDES (R$ 195 mil), além de R$ 300 mil da Fundação Banco do Brasil. Porque catador que é catador merece um bom investimento — especialmente se a plateia for favorável.

Agora, não pense você que isso começou ontem. A ExpoCatadores também teve edição em 2022, sob Jair Bolsonaro. Só que, naquela época, veja só que curioso: nenhuma estatal bancou o evento, segundo o próprio site oficial.

Mas nada como um novo mandato petista para ressuscitar tradições: conferências com a sociedade civil, outro clássico da era Lula, voltaram com tudo. E quem paga a conta? Estatais, bancadas por nós, claro.

A Caixa despejou R$ 300 mil na Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em 2024. O presidente não se conteve em denegrir apenas seu adversário atual e disparou contra todos seus antecessores:

“É por isso que nós fizemos um esforço muito grande de fazer o que foi feito em apenas 18 meses. Em 18 meses, eu já me reuni mais como presidente da República do que antes nos meus oito anos. E a somatória do que eu fiz em oito meses é mais do que todos os presidentes, desde Marechal Deodoro até agora.” Se vangloriou o petista no palanque bancado às nossas custas.

O Banco do Brasil, não querendo ficar atrás, botou R$ 150 mil na Conferência Nacional de Segurança Alimentar em 2023 e mais R$ 1 milhão e R$ 1,5 milhão em conferências de Ciência e Cultura, respectivamente, em 2024. E adivinha? Lula discursou em duas dessas. Espontaneamente, claro.

Essas conferências, segundo o roteiro, servem para ouvir propostas da sociedade civil. Mas também servem, vejam só, para mostrar que o governo “dialoga” com o povo. Em 2022, no lançamento da chapa com Alckmin, Lula prometeu voltar com tudo: “Vamos precisar convocar tudo outra vez”. Pedido atendido.

E claro, não podemos esquecer os icônicos atos de 1º de Maio com as centrais sindicais — com direito a microfone e tudo para o presidente. E quem bancou o show? O Conselho Nacional do Sesi, com contratos de R$ 600 mil em 2023 e R$ 500 mil em 2024. Quem correu atrás da verba? A CUT, velhíssima conhecida do PT. Parceira de sempre.

Mas, por favor, nada de pensar mal: tudo isso é estratégia, pura estratégia. Política? Que nada.


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