Calada da noite: Haddad, Alcolumbre e Motta se juntam para tungar contribuinte e manter gastança

Governo escolhe apertar o bolso do brasileiro em vez de cortar o próprio banquete. Congresso ameaça fazer história e derrubar decreto presidencial pela primeira vez em 25 anos.

Por Victório Dell Pyrro

Na surdina, no conforto de residência oficial nababesca, refrigerados enquanto você pagava boleto ou assistia reprise do Fantástico, o ministro Fernando Haddad (o arecadador carinhosamente chamado pela população de Taxaad), o sempre discreto presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP) (rei das comissões) e o presidente da Câmara dos Deputados, Luiz Carlos Motta (Republicanos-PB) (fiel escudeiro do orçamento) decidiram fazer o que Brasília sabe fazer de melhor: conspirar para enfiar a mão no bolso de quem produz e trabalha.

Eles se reuniram na residência oficial da Câmara dos Deputados e Hadaad anunciou na noite deste domingo (8) que o governo pretende editar uma MP para aumentar a arrecadação e “recalibrar” o decreto sobre a alta do IOF.

A pauta? Evitar uma derrota acachapante para o governo Lula: a derrubada, via Congresso, do decreto que limita o uso de créditos tributários por empresas — ou, em bom português, mais uma maneira criativa de tirar dinheiro do setor produtivo para tapar buraco de governo gastador.

Se cair o decreto, lá se vão R$ 29 bilhões da contabilidade do ministro Haddad — aquele superávit fiscal prometido para 2025 já virou ficção científica há meses. Mas como cortar gasto público dói mais em Brasília do que imposto dói no trabalhador, a turma preferiu organizar uma operação noturna.

No final da reunião de domingo, Motta e Alcolumbre saíram dizendo que haviam conseguido uma vitória porque o decreto do IOF seria revisado e também porque o governo estava de acordo com uma revisão de gastos públicos. Ocorre que houve uma derrota política dos representados pelos pelos presidentes Câmara e do Senado, nós.

Na prática, haverá um aumento de impostos, ainda que menor do que o inicialmente desejado pelo Palácio do Planalto e pelo Ministério da Fazenda.

Além da recalibragem do decreto do IOF, algumas das mudanças anunciadas por Haddad foram:

  • Edição de medida provisória que prevê que títulos isentos de Imposto de Renda (IR), como a Letra de Crédito Imobiliário (LCI) e a Letra de Crédito do Agronegócio (LCA), vão passar a ter alíquota de 5% de IR;
  • equalizar a tributação da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para instituições financeiras, o que inclui fintechs. A alíquota de 9% será excluída e a cobrança ficará de 15% a 20%;
  • aumentar taxação das apostas esportivas para 18% (a alíquota incide no chamado GGR que é a diferença entre o que a bet fatura com as apostas menos os prêmios pagos aos vencedores);
  • redução do gasto tributário em pelo menos 10%.

Detalhe curioso: em pelo menos 25 anos, o Congresso nunca derrubou um decreto presidencial via PDL (Projeto de Decreto Legislativo). Isso é tipo o VAR anulando gol do time da casa em final de campeonato. Mas quando o governo passa do limite, até a paciência do Congresso tem um fim. A impressão é que a cozinha palaciana resolveu fritar o contribuinte em fogo alto — e agora pode levar um belo tombo político.

A turma do deixa-estar

Resumindo: qual foi o plano genial dessa turma? Nenhum corte em mordomia, nenhum enxugamento nos R$ 6 bilhões de emendas parlamentares liberados na última semana. Nada disso. O cardápio foi tentar empurrar o problema com a barriga, prometendo uma futura discussão, e enfiar mais impostos na goela do contribuinte, e um quem sabe talvez um dia, uma compensação para as empresas afetadas. Brasília é craque em prometer “para depois”.

O comandante dessa operação é Alcolumbre, o mesmo que tem cadeira cativa nos bastidores de votações cabeludas. Na Câmara, Motta tenta ser o bombeiro, mas o incêndio está se espalhando rápido demais.

Economistas em modo pistola

Do lado de quem lê planilhas e não discursos, a indignação é geral. “Isso não é ajuste fiscal, isso é pedalada tributária com salto alto”, cutucou Marcos Lisboa. Já Elena Landau, que não costuma ter papas na língua, resumiu bem: “Ao invés de mexer nos próprios privilégios, o governo prefere jogar mais um imposto disfarçado no colo de quem gera emprego”.

As confederações empresariais já afiaram o facão e estão pressionando Congresso e opinião pública. Afinal, nada como anunciar aos quatro ventos que o governo quer “melhorar as contas” arrancando mais imposto da indústria, do comércio e, claro, de quem paga pelo fim: o consumidor.

Tunga” na veia

O que se vê é um governo que prometeu responsabilidade fiscal, mas que só enxerga a solução no que já virou tradição nacional: tungar o contribuinte. O Tesouro está com a tampa aberta, o Congresso de olho nas emendas, e quem paga a conta continua sendo quem trabalha e produz.

Se o PDL passar, (muito improvável com os aliados de Lula no comando do Congresso) Haddad entra para a história como o ministro que não só perdeu receita, mas também prestígio. E Lula descobriria que o Congresso não é tão amigo assim quando o governo esquece que política também é saber dizer “não” para os próprios excessos.

Por enquanto, a crise foi adiada à base de jantar regado a bons vinhos, tapinha nas costas e reuniões fora da agenda. Mas fica a lição: em Brasília, quem trabalha de dia é o cidadão. Quem arma à noite é o governo.

E você aí, achando que o problema era só segunda-feira.


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