Mapeamento do MPSP mostra que facção criminosa se instalou em pelo menos quatro continentes para cometer crimes
Um mapeamento do Ministério Público de São Paulo obtido que tem sido apresentado a embaixadas e consulados fora do país para cooperação internacional no combate a crimes transnacionais em pelo menos quatro continentes, mostra que a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) se instalou em aos menos 28 países.
Segundo o relatório, o PCC se infiltrou em presídios no exterior para recrutar novos membros e expandir crimes como tráfico de drogas e armas, além da lavagem de dinheiro.
Além da expansão para diferentes territórios, o que tem chamado a atenção das autoridades e investigadores brasileiros e também estrangeiros é o fato de os integrantes do PCC terem buscados outros países não só para viagens temporárias, mas também como moradia fixa e infiltração em cadeias, uma espécie de “marca registrada” da facção criminosa paulista.
O mapeamento foi feito através do vazamento de informações, informações coletadas de inteligência, por meio do monitoramento de integrantes do PCC que fazem parte das chamadas “Sintonia dos Estados” e “Sintonia dos Países”, setor do PCC cujos membros são responsáveis pelo acompanhamento do desenvolvimento da facção fora do estado de São Paulo e fora do Brasil, além da análise de dados a partir da quebra do sigilo telefônico e telemático de investigados e da troca de informações com autoridades estrangeiras.
A maioria dos integrantes do PCC no exterior ainda se concentra na América Latina e na América do Sul. Os países com o maior número de membros faccionados são Paraguai, Venezuela, Bolívia e Uruguai, e são considerados territórios importantes para a expansão do tráfico de drogas e armas, já que fazem uma extensa fronteira com o Brasil e também são produtores do principal produto de exportação para a Europa: a cocaína.
Peru
Assim como Bolívia e Colômbia, o Peru é importante pela produção de cocaína.
O PCC tem intermediários e “representantes comerciais” atuando na região.
Em 1993, quando foi fundado na Casa de Custódia de Taubaté, interior de São Paulo, o grupo contava com menos de 10 integrantes, em uma união para tentar fugir da perseguição dos outros internos e de evitar abusos dentro dos presídios após o Massacre do Carandiru, em 1992. Desde então, o PCC se tornou uma das maiores facções do Brasil, com diversas ramificações internacionais.
Após quase três décadas o grupo criminoso conta com quase 40 mil integrantes e chega a faturar cerca de R$ 1 bilhão por ano, segundo o Ministério Público de São Paulo, principalmente com o tráfico internacional de drogas, e está presente em cadeias de 24 estados brasileiros, com exceção apenas do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, como consta em relatório da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen).
Portugal aparece em 5º lugar da lista de países com o maior número de integrantes do grupo criminoso e é o principal país da Europa em proporção da presença da facção.
Isso tem se refletido em prisões em flagrante, apreensões de drogas e investigações sobre o PCC por parte das autoridades portuguesas. Nos últimos anos, as polícias locais confirmam terem prendidos membros da facção tentando levar cocaína em submarinos e em outras embarcações adaptadas pelo crime organizado para cruzar o Oceano Atlântico até a Europa.
A Itália é considerada outra importante rota para a entrada de cocaína pelo tráfico internacional de drogas. Nos últimos anos, máfias italianas se uniram ao PCC para remessas, a partir dos países produtores na América do Sul com destino à Europa. E apesar de ter menos integrantes da facção fixados em seu território ou em presídios, a Itália é apontada como uma das maiores preocupações das autoridades brasileiras para combate ao narcotráfico, o que demanda integração.
Informações detalhadas sobre o esquema entre o PCC e a máfia da Calábria foram reveladas pelo traficante italiano Vincenzo Pasquino preso no Brasil e extraditado, que fez acordo de delação com a Justiça da Itália e está preso em Roma. Pasquino morou na cidade de São Paulo, onde negociava com a facção criminosa. Os carregamentos saíam do país em grande quantidade pelo mar para famílias de mafiosos na Itália.
Espanha
Relacionamento próximo com máfias espanholas e organizações locais de tráfico.
Prisões de brasileiros ligados ao PCC ocorridas principalmente em Madri e Barcelona.
Emirados Árabes Unidos (Dubai)
Dubai vem sendo utilizada por membros ligados ao PCC para lavagem de dinheiro e tráfico internacional.
Alguns dos principais “barões” do tráfico ligados à facção foram presos no local.
África do Sul
Rotas de tráfico e presença de intermediários.
O continente africano tem sido usado como escala para drogas com destino à Europa.
México
Contato com cartéis mexicanos como o Sinaloa e o Cartel Jalisco Nova Geração (CJNG) para negociação de tráfico e rotas alternativas.
O mapeamento de inteligência que têm sido usado por embaixadas e consulados apresenta países que colocaram em foco investigações sobre tráfico de drogas e alerta para o contato do PCC com outras organizações criminosas internacionais que se especializaram na lavagem de dinheiro para o financiamento do terrorismo.
A Sérvia é um deles. Apontada como uma rota para tráfico de armas, segundo o promotor do Lincoln Gakiya, a presença do PCC na região possivelmente se deve a algum tipo de acordo para facilitar a também logística de compra e venda de armas, que nem sempre é feita por italianos. Segundo ele, há muita logística também feita por sérvios e por albaneses.
Já o Líbano não é visto como um país fornecedor ou mesmo destino final de drogas. Por isso, a presença do PCC é vista como uma possibilidade de conexão com lavagem de dinheiro, chamado por analistas de “convergências criminais de grupos criminosos”.
Um alerta similar partiu do país vizinho ao Líbano, Israel. Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), obtidos pela Polícia Federal e pelo Ministério Público de São Paulo, indicam que uma fintech de propriedade de um policial civil se envolveu em transações suspeitas com criptomoedas relacionadas a organizações terroristas. Os relatórios não dão os nomes das organizações terroristas.
As informações sobre possíveis relações da fintech com terroristas foi feito pelo Ministério da Defesa de Israel, que emitiu um comunicado sobre a existência de carteiras digitais mantidas em uma exchange (corretora) que seriam operacionalizadas para movimentação de criptomoedas “com fins de perpetração do crime de terrorismo, conforme os critérios da lei israelense”.
Segundo a PF e o MP, a partir dessa informação, um banco brasileiro monitorou transações em criptoativos, identificando transações entre carteiras digitais de exchanges e as carteiras digitais elencadas no comunicado.
Após o cruzamento de dados, o banco concluiu que “há relação entre os ativos virtuais adquiridos pelos clientes do Banco Topázio no exterior com recursos enviados por meio de operações de câmbio com as wallets listadas no comunicado emitido pelo Ministério da Defesa Israelense.”
Do outro lado do mapa, o Japão tem registro de presença definitiva do PCC. É destino final para a venda de cocaína, mas permanência de traficantes no continente asiático é vista como possibilidade para favorecer o tráfico na região de Hong Kong e também para Oceania, como a Austrália, por causa do valor médio do quilo da droga, que pode passar de US$ 150 mil.

