Investigada por envolvimento em um dos maiores esquemas de fraude já identificados contra aposentados do INSS, a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag) foi reconduzida pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a um assento em um conselho estratégico da administração federal. A decisão, que contraria o discurso oficial de defesa dos mais vulneráveis e de combate a irregularidades, mantém no coração do Estado uma entidade acusada pela Polícia Federal e pela Controladoria-Geral da União de participar de um mecanismo que desviou bilhões de reais de benefícios previdenciários por meio de descontos associativos não autorizados.

A recondução garante à Contag mais dois anos de influência direta na formulação de políticas públicas ligadas à Previdência e ao meio rural, mesmo após investigações apontarem que, entre 2019 e 2024, a confederação esteve associada a descontos que podem chegar a cerca de R$ 2 bilhões retirados diretamente de aposentadorias e pensões. Segundo a Polícia Federal, em inúmeros casos os beneficiários sequer tinham conhecimento de qualquer filiação à entidade, descobrindo os débitos apenas ao perceberem a redução do valor recebido mensalmente.
O gesto do Planalto não é isolado. Apesar de figurar no centro das apurações sobre fraudes no INSS, a Contag ampliou sua presença institucional nos últimos meses. Em agosto, garantiu vaga no Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, órgão que deveria justamente zelar pela proteção de um público diretamente lesado pelo esquema investigado. Também foi escolhida para representar agricultores familiares na COP-30, em Belém, com uma delegação de mais de mil integrantes, conferindo projeção internacional a uma entidade sob suspeita de explorar financeiramente aposentados. Paralelamente, a CGU instaurou dezenas de processos de responsabilização contra associações e sindicatos envolvidos em um sistema de descontos indevidos que pode ter alcançado R$ 6,3 bilhões.
As investigações detalham um método recorrente e sistemático. De acordo com relatórios da Polícia Federal e do Ministério Público, entidades apresentavam ao INSS listas em massa de supostos associados, muitas vezes forjadas ou sem qualquer consentimento dos beneficiários, habilitando descontos automáticos diretamente nos benefícios previdenciários. No caso da Contag, há indícios de que a confederação encaminhou cadastros de pessoas que jamais autorizaram a cobrança. Em 2023, segundo a PF, um único lote liberado pela entidade resultou em 34 mil descontos considerados irregulares, evidenciando a escala industrial da prática.
A tolerância política à Contag encontra explicação em suas ligações históricas com o presidente Lula e com o PT. A confederação é aliada antiga do campo petista, com vínculos orgânicos ao sindicalismo rural e à Central Única dos Trabalhadores. Desde os anos 1990, a CUT investiu na aproximação com entidades do meio rural, culminando na filiação formal da Contag à central em 1995, consolidando uma relação política que atravessou governos e se manteve intacta mesmo diante de escândalos.
No atual mandato, essa proximidade se traduziu em benefícios concretos. Em maio, Lula assinou um decreto que atendeu a uma demanda direta da Contag ao prorrogar por quatro anos a exigência de georreferenciamento de imóveis rurais de até 25 hectares. A entidade também emplacou representantes no Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, ampliando sua presença em instâncias-chave da política social. A soma dessas decisões reforça a percepção de que a confederação segue blindada por sua relevância política para o governo, independentemente das acusações que enfrenta.
Mesmo sob investigação por fraudes que atingiram justamente aposentados e pensionistas — público que o discurso lulista afirma priorizar —, a Contag permanece tratada no Planalto como parceira estratégica, ao lado de organizações como o MST, compondo a base social e política do governo. Essa rede de alianças garante acesso privilegiado a ministérios e à Presidência da República, ao mesmo tempo em que alimenta críticas da oposição e pressões por investigações no Congresso, incluindo CPIs que já convocaram dirigentes de entidades envolvidas no esquema.
A decisão de renovar o assento da Contag em conselhos governamentais escancara um paradoxo incômodo. Ao manter e até fortalecer a influência de uma entidade investigada por fraudes bilionárias, o governo Lula envia um sinal inequívoco de que a lealdade política e a afinidade ideológica pesam mais do que a responsabilidade institucional e a proteção dos aposentados. Para milhões de idosos que tiveram descontos não autorizados em seus benefícios, a mensagem é dura: a entidade suspeita de explorá-los segue prestigiada e com poder de decisão sobre políticas públicas.
Do ponto de vista da governança e da ética pública, a escolha fragiliza o discurso oficial de combate à corrupção e defesa dos vulneráveis. As ligações históricas entre Lula, o PT e a Contag ajudam a explicar a decisão, mas não a justificam. Manter uma organização sob investigação no centro do aparelho de Estado, enquanto aposentados aguardam ressarcimento integral e responsabilização dos envolvidos, expõe uma contradição profunda entre a retórica do governo e suas práticas concretas.




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