Dados da PNAD Contínua expõem expansão recorde no setor público com 13,1 milhões de vagas, enquanto privado patina; governo celebra, mas críticos veem assistencialismo disfarçado e manipulação estatística
Por Victório Dell Pyrro
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou nesta terça-feira, 30 de dezembro de 2025, os dados mais recentes da PNAD Contínua relativos ao trimestre encerrado em novembro, imediatamente celebrados pelo governo federal como prova de um suposto “recorde histórico” do mercado de trabalho.
A taxa oficial de desemprego foi estimada em 5,2%, a menor da série iniciada em 2012, com 103,2 milhões de pessoas ocupadas no país. Por trás da propaganda oficial, porém, os próprios números do IBGE revelam uma realidade menos virtuosa e muito mais preocupante: o crescimento do emprego está fortemente concentrado no setor público, que atingiu o patamar inédito de 13,1 milhões de empregados, evidenciando um processo acelerado de inchaço da máquina administrativa.
O contingente de trabalhadores no setor público cresceu 3,8% em relação ao ano anterior e 1,9% apenas no trimestre, o equivalente a 250 mil novas vagas no período e 492 mil em doze meses. Na prática, foi o único grupamento com expansão expressiva. Enquanto o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva festeja o discurso de “emprego em alta”, o setor privado formal avançou de forma tímida e o informal apresentou retração anual, confirmando que o Estado tem funcionado como principal motor artificial da ocupação no país, em um cenário de atividade econômica fraca e investimentos contidos.
Segundo o próprio IBGE, áreas como administração pública, defesa, previdência, educação, saúde e serviços sociais concentraram cerca de 310 mil novos postos apenas em novembro, número muito acima da média mensal observada ao longo do ano. Parte desse salto tem sido associada à preparação para a COP-30, prevista para Belém, mas especialistas apontam que o fenômeno vai muito além de eventos pontuais e reflete uma política deliberada de expansão do Estado, sem a devida avaliação de eficiência, impacto fiscal ou retorno para a sociedade.
A consequência direta desse modelo é o agravamento da pressão sobre as contas públicas. O salário médio do setor público segue cerca de 80% superior ao do setor privado, e a folha de pagamento, somada à previdência dos servidores, já consome parcela crescente da arrecadação. Projeções de mercado indicam que o rombo fiscal pode ultrapassar R$ 300 bilhões em 2026, enquanto a dívida pública se aproxima de 80% do PIB. Ainda assim, o governo insiste em usar os dados da PNAD como peça de propaganda, ignorando que o aumento da ocupação decorre majoritariamente de contratações estatais e não de um ciclo saudável de crescimento econômico.
No debate sobre a credibilidade dos números, voltou a circular nas redes sociais a alegação de que o IBGE estaria “escondendo desempregados” ao excluir beneficiários do Bolsa Família ou de outros programas sociais das estatísticas. Os próprios critérios técnicos do instituto desmentem essa narrativa. Primeiro, o IBGE considera como desocupada toda pessoa sem trabalho que tenha buscado emprego de forma ativa nos últimos 30 dias, independentemente de receber Bolsa Família, Benefício de Prestação Continuada ou qualquer outro auxílio. Segundo, beneficiários de programas sociais são incluídos na População Economicamente Ativa sempre que estão procurando trabalho, seguindo rigorosamente a metodologia da Organização Internacional do Trabalho, sem qualquer alteração recente nos critérios. Terceiro, apenas quem não busca ocupação, por desalento ou outras razões, é classificado fora da força de trabalho, o que não configura manipulação, mas aplicação de padrão internacional consolidado.
Ainda assim, a leitura crítica dos dados expõe um problema estrutural: a queda do desemprego não reflete dinamismo do setor produtivo, mas sim a substituição de empregos privados por vagas financiadas pelo contribuinte. Setores estratégicos como indústria e construção seguem sem tração consistente, mesmo com a taxa básica de juros em níveis elevados, sinalizando um ciclo econômico frágil mascarado por contratações públicas. A renda média real até apresentou alta, chegando a R$ 3.418, mas de forma desigual, beneficiando sobretudo o funcionalismo, enquanto grande parte dos trabalhadores permanece em ocupações de baixa qualidade.
Ao vender o recorde de empregados públicos como sucesso econômico, o governo ignora deliberadamente o custo dessa escolha. O aumento contínuo do aparato estatal, sem reforma administrativa e sem controle rigoroso de gastos, transfere para o futuro uma conta pesada, que recairá sobre o contribuinte na forma de mais impostos, inflação ou endividamento. Os dados da PNAD Contínua não apontam para um Brasil em pleno emprego, mas para um país que substitui crescimento sustentável por expansão do Estado, transformando o inchaço administrativo em política pública permanente.



