Reportagem investigativa da revista crusoé denuncia suposto envolvimento do Partido dos Trabalhadores com o crime organizado
Inquéritos sigilosos divulgados nesta sexta-feira (8) pela revista Crusoé, mostram como a facção criminosa PCC está ligada a integrantes do PT.
Há exatamente um mês, a Polícia Civil de São Paulo cumpriu mandado de busca e apreensão na casa de Senival Moura, lider do PT na Câmara de Vereadores de São Paulo. Este é o fio da meada da reportagem investigativa.
Ele seria preso na operação, mas a justiça negou o pedido da policia, que o investiga por lavagem de dinheiro para a Primeiro Comando da da Capital (PCC) e envolvimento no assassinato do do empresário Adauto Soares Jorge, presidente da cooperativa Transunião Transportes empresa, que teria controle compartilhado entre o vereador petista e a organização criminosa, possui contrato de R$ 100 milhões por ano com a Prefeitura de SP, para prestar serviços na Zona Leste da capital paulista.
No inquérito, segundo a Crusoé, o delegado Vagner Alves da Cunha relata que a investigação do assassinato enveredou pela politica a partir da colaboração espontânea de uma fonte ligada à vítima.
Segundo o depoente, identificado apenas como “Guilherme” e cuja identidade real é mantida em sigilo absoluto, Senival seria figura central do esquema do PCC no transporte público alternativo em SP. Suas campanhas eleitorais, desde 2002, teriam sido bancadas pelo crime organizado.
De acordo com o colaborador, apesar de ser figura conhecida entre perueiros e diretamente responsável por intermediar a legalização da atividade junto à gestão da prefeita Marta Suplicy (2001-2005), Senival precisou de volumosos recursos financeiros para entrar na politica.
“O crime organizado foi seu primeiro financiador, oportunidade em que dois criminosos alcunhados como “Cunta“, já falecido, e “Alexandre Gordo“, que está preso há muitos anos, encarregaram-se da tomada de recursos”.
Em seu relatório, o delegado identifica “Cunta” como o assaltante Ricardo Pereira dos Santos, morto em 2012, durante uma tentativa de roubo à transportadora de valores Protege, em SP.
“Alexandre Gordo” seria o sequestrador Alexandre Ferreira Viana, preso desde 2005. “Como contrapartida ao financiamento, (Senival) criou um modelo de lavagem de dinheiro que permitiu aos criminosos ocultar os valores obtidos a partir da prática de crimes nas cooperativas de transporte regulamentadas.”
O colaborador, que parece conhecer por dentro o esquema, disse à Policia que os alvarás de funcionamento das vans e os veículos em si, eram comprados com dinheiro em espécie, de origem criminosa, e cadastrados em nome de laranjas”, que ocupavam funções de motoristas e cobradores. “O rendimento era encaminhado posteriormente para os familiares dos criminosos e serviam para custear o estilo de vida confortável (…) Senival sempre esteve à frente da cooperativa de peruas, instaladas há muitos anos no bairro do Itaim Paulista (…) as pessoas que o sucederam no comando da cooperativa e, depois da empresa, foram seus laranjas (…) Adauto é mais um dos laranjas”, diz Guilherme.
A execução do empresário Adauto Soares Jorge teria sido determinada pelo PCC após suspeita de desvios recursos do esquema. “Descobriu-se que Adauto estava desviando dinheiro da empresa para subsidiar uma espécie de caixa dois para as eleições de 2020, oportunidade em que Senival Moura seria diretamente privilegiado, já que tais valores seriam empregados em sua campanha à reeleição.”
A Policia Civil afirma ainda que o tribunal do crime do PCC sentenciou Adauto e Senival à morte, mas o vereador conseguiu obter o perdão sob a promessa de encomendar o assassinato do empresário e abrir mão de sua participação na Transunião.
Antes do assassinato, o grupo criminoso teria nomeado novos diretores para o comando da empresa, um deles chamado Leonel Moreira Martins, Integrante do PCC envolvido no assalto ao Banco Central em Fortaleza, 2005, e também na fuga de 87 criminosos do Carandiru, em 2003. Os investigadores cruzaram as informações fornecidas pelo colaborador com dados extraídos do celular do empresário morto. Imagens das câmeras do estacionamento onde Adauto foi executado apontaram a participação de seu motorista, que manteve contato telefonico com o vereador petista durante o crime, segundo registros de chamadas obtidos junto às operadoras.
Logo após a operação, Senival fol à tribuna da Câmara se defender. Disse que se afastou da Transunião em fevereiro de 2020 e já não teria qualquer relação com a empresa, muito menos com o crime. “Operamos com a Transunião até o dia 4 de fevereiro de 2020. No dia 5 teria uma assembleia da empresa, e eu e o Adauto Soares jorge fomos recomendados a não participar. Quando recebi isso, achei melhor ir embora. Nós criamos essa empresa, mas me desliguei” disse.
O PT mantém o vereador na liderança do partido na Câmara e nenhum processo disciplinar foi aberto para avaliar sua conduta, apesar do histórico relacionado ao PCC. Em 2014, por exemplo, ele entrou na Investigação que fisgou seu irmão, o ex-deputado estadual Luiz Moura, flagrado por policiais do Departamento Estadual de Investigações Criminals (Deic) durante reunião na sede de uma outra cooperativa, a Transcooper, também supostamente associada à facção criminosa. Na ocasião os investigadores apuravam a onda de ataques incendiários a ônibus em São Paulo. No encontro, havia 18 membros da facção crimina e outros 26 com alguma passagem polícia. Moura só não foi levado para a delegacia porque se apresentou como parlamentar.
O primeiro grão petista a se dar conta do poder de fogo eleitoral da dupla foi Arlindo Chinaglia, que se beneficiou de votações expressivas nos currais eleitorals dos Moura. O segundo foi jilmar Tatto, que chegou à Câmara dos Deputados com apoio da turma do transporte alternativo e virou secretário dos Transportes na gestão de Fernando Haddad (2013-2017). Quando a investigação sobre os ataques incendiários a ônibus, veio à tona na pré-campanha de 2014, Tatto disse que sua relação com Luiz Moura era Institucional. Mas, nas eleições de 2010, ele injetou 200 mil reals para eleger o lider dos perueiros. Não foi o único, Marta Suplicy pôs mais 30 mil reals. Também o ajudaram financeiramente Aloizio Mercadante, José Genoino, João Paulo Cunha, Devanir Ribeiro, Cândido Vaccarezza, Carlos Zarattini e o próprio Chinaglia. Todos naturalmente, alegaram desconhecer a ligação do parlamentar com o PCC, mas Luiz Moura, antes mesmo de se fillar ao PT, ja ostentava uma ficha criminal com condenação de 12 anos de cadeia por assalto a mão armada-pena que acabou perdoada em 2005.
Três semanas antes da operação contra Senival, em 9 de junho último, Jilmar Tatto foi removido da coordenação da campanha de Lula para essas eleições, sob a justificativa de que passaria a se dedicar à eleição de Haddad ao governo estadual. Nos bastidores, o PT tenta evitar a instalação, na Câmara de Vereadores de São Paulo, de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o transporte alternativo de passageiros.
Na segunda-feira passada, na Câmara dos Deputados, em Brasilia, o deputado carlos Sampaio do PSDB protocolou um pedido de inquérito sobre as declarações recentes do ex-publicitário do PT, Marcos Valério, pivô do mensalão, que em delação na Lava Jato, disse com todas as letras que Celso Daniel, prefeito de Santo André, assassinado em 2002, havia produzido um dossie detalhando quem estava sendo financiado de forma ilegal pelo crime organizado.
Além de condenado no mensalão a quase 40 anos de prisão, Valério fol alcançado em 2017, na investigação sobre o empréstimo ilegal de 12 milhões de reais obtido pelo pecuarista José Carlos Bumlai junto ao Banco Schahin, para atender ao PT. Metade do valor foi repassado ao empresário dos transportes Ronan Maria Pinto, que, segundo Valério, tería chantageado Lula para não contar detalhes de um esquema de arrecadação ilegal de recursos para financiar petistas, por melo de empresas de ônibus, lixo, transporte pirata e bingos.
As investigações da Lava Jato se limitaram ao crime de lavagem de dinheiro, pelo qual Ronan acabou condenado a cinco anos de prisão. Os autos do inquérito da Operação Carbono 14 (27ª fase da Lava Jato), porém, são fartos de indicios que podem corroborar as declarações de Valério.
Em 2015, foi o ano que o Banco Schahin havia concedido 24 empréstimos irregulares, incluido o de Bumlai, num total superior a R$ 300 milhões. Entre os devedores, nunca cobrados, estavam justamente empresas de coleta de lixo e transporte público que já se beneficiaram de milionários contratos com gestões petistas em vários municipios paulistas, inclusive na capital, a partir da gestão de Marta Suplicy. Na lista, também havia empresas identificadas pela Receita como veículos para remessa de dólares ao exterior. Duas delas integrariam a rede da doleira Neima Kodama, condenada no Petrolão e que foi presa em Portugal, em abril deste ano, na Operação Descobrimento, acusada de integrar esquema Internacional de tráfico de drogas do PCC. Nelma é velha conhecida dos escândalos do PT, tendo sido citada na CPI dos Bingos e até nas investigações de corrupção na gestão Celso Daniel-na ocasião, ela mantinha uma casa de câmbio em Santo André. O Banco Schahin, antes de quebrar por causa daqueles empréstimos fraudulentos, foi vendido ao BMG, o mesmo que emprestou milhões ao PT via Marcos Valério, como revelaram as investigações do mensalão.
A Crusoé ainda informa que a cúpula do PT teme mesmo é o avanço de outra investigação deflagrada recentemente contra João Muniz Leite, contador de Lula e também suspeito de lavar dinheiro para o PCC. Uma semana após a operação contra Senival, o Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos (Denarc) pediu à Justiça o sequestro de bens de Muniz Leite e de sua mulher, que, segundo as investigações, ganharam 55 vezes em loterias federais e somente em 2021. Em uma das vezes, ele dividiu um prêmio de 40 milhões de reais da Mega Sena com o traficante Anselmo Bechell Santa Fausta, o Cara Preta, de quem também era contador. Principal fornecedor de drogas do PCC, o traficante foi morto em dezembro passado, num caso rumoroso envolvendo a lavagem de até 2 bilhões de reais em criptomoedas. Os policiais desconfiam que o dinheiro da loteria foi usado por Cara Preta para comprar, além de imóveis e veículos de luxo, uma empresa de transporte paulista, a UPBus, em parceria com outros cinco integrantes do PCC e 18 de seus familiares.
A tese de que o contador Muniz Leite atuaria apenas como “laranja do líder do PCC é reforçada por uma recente ação de cobrança contra ele, em cujas contas a justiça paulista nada encontrou. Segundo o delegado Fernando Santiago, do Denarc, ele abriu, a mando de Cara Preta, várias empresas de fachada, usadas para ocultar a origem dos recursos lícitos. Na operação contra Muniz Leite, Cara Preta e outros criminosos, foram apreendidos vários ônibus da UPBus, que, assim como a Transunião e a Transcooper, mantém contratos que chegam a R$600 milhões com a Prefeitura de São Paulo. As três empresas supostamente controladas pelo PCC (UPBus, Transunião e Transcooper/Pêssego Transportes) fazem parte do grupo de 14 cooperativas que tiveram seus contratos renovados pela prefeitura em 2017, de forma emergencial. A contratação se deu por atraso no lançamento da nova licitação, desde que o edital elaborado na gestão Haddad/Tatto fol suspenso por decisão judicial, devido a uma série de impropriedades. Curiosamente, o contador de Cara Preta também foi responsável por abrir empresas de Roberto Teixeira, compadre e advogado de Lula, e dos filhos do ex-presidente. Os mais recentes CNPJs de Fábio Luis Lula da Silva, o Lulinha, e sua esposa Renata foram providenciados por ele, responsável também pelas declarações anuais de IR do petista há mais de 15 anos. Como profissional autónomo, Muniz Leite pode ter diversos clientes e estes não têm como saber de eventual envolvimento do contador com alguém do mundo do crime. Mas causa surpresa que Lula tenha mantido o profissional, mesmo após sua exposição na Lava Jato, diz a Crusoé.
Muniz Leite foi acusado pelo MPF no Paraná de forjar recibos de aluguel para justificar uso, pelo ex-presidente, de um apartamento contiguo ao seu em São Bernardo do Campo, registrado em nome de Glaucos da Costa Marques, primo do mesmo Bumlai envolvido no repasse a Ronan Maria Pinto. O enredo fica ainda mais complexo quando se descobre que o contador também integrou o quadro societário de uma empresa de Claudio Rocha Júnior, um dos integrantes da quadrilha de Nelma Kodama, que foi preso em abril, em Portugal. De acordo com a Polícia Federal, Rocha Júnior integraria o primeiro escalão do esquema de tráfico Internacional e lavagem de dinheiro comandado pelo PCC na América do Sul, na Europa, nos Estados Unidos e na Austrália. Ele seria um dos donos da carga de quase 600 kg de cocaina apreendida na fuselagem de um jato fretado em Cascais Portugal. Outra coincidência é que uma segunda empresa de Rocha Júnior, citada na Lava Jato, teve como sócios o próprio Glaucos Costa Marques e o advogado Fablo Haruo Tsukamoto, sócio de Luis Cláudio Lula da Silva, outro filho de Lula.