Ministro da corte eleitoral determinou que campanha de Lula retire peça da TV, site e redes sociais
O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, do Tribunal Superior Eleitoral, determinou neste sábado (8) que a campanha do ex-presidente e ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva retire a propaganda falsa que tenta associar o presidente Jair Bolsonaro ao canibalismo.
A campanha lulista usou em inserções na televisão edição maliciosa de vídeo de antiga entrevista de Bolsonaro ao jornal The New York Times. Neste sábado, Lula defendeu o uso da peça mentirosa.
Em decisão liminar, o ministro do TSE determinou a imediata suspensão da veiculação da peça na TV, site e redes sociais. O PT também está proibido de divulgar novas propagandas com o mesmo teor.
“Em análise superficial, típica dos provimentos cautelares, verifica-se que, como alegado, a propaganda eleitoral impugnada apresenta recorte de determinado trecho de uma entrevista concedida pelo candidato representante, capaz de configurar grave descontextualização”, escreveu Sanseverino.
O PT, que se diz inclusivo e que respeita a cultura, criou com a sua versão do gabinete do ódio, a falsa ideia, sem levar em consideração a cultura indígena que Bolsoanaro queria compreender e participar, mas que sequer conseguiu ir.
O vídeo que o PT viralizou nas redes sociais nesta semana, no qual Bolsonaro aparece dizendo a um jornalista que quase “comeu um índio” que teria sido “cozido” pelos indígenas contém desinformações sobre o povo Yanomami, de Roraima. O yanomami Junior Hekurari, presidente do Condisi (Conselho do Distrito Sanitário Indígena) Yanomami, disse que os Yanomami do Surucucu, não são canibais, “nunca tivemos isso. Não tem um relato [sobre isso]. Nem relatos ancestrais nem atuais”, informou.
Hekurari disse ter conhecimento de que um grupo indígena Yanomami, já localizado na Venezuela e conhecido como Xamathari, pratica o ritual fúnebre de cremar o corpo dos guerreiros o que pode durar dias ou semanas, triturar e pulverizar os ossos e, por fim, misturar as cinzas, já bastante pulverizadas e em pequenas quantidades, como se fosse sal ou pimenta, a um caldo de banana, que somente então é consumido pelos familiares do morto. Mas esse ritual não prevê o consumo da carne humana.
Nos rituais fúnebres realizados na região de Surucucu, no Brasil, de acordo com Hekurari, as cinzas são enterradas, e não consumidas.
A antropóloga Alcida Rita Ramos, doutora em Antropologia pela Universidade de Wisconsin-Madison (EUA), que participou do processo de demarcação da Terra Indígena Yanomami e é professora emérita da UnB (Universidade de Brasília), no final dos anos 1960 e início dos anos 1970 viveu mais de dois anos nas comunidades Yanomami. Ela explicou à Agência Pública – em um pequeno texto que intitulou “Canibais são os outros” o passo a passo do ritual funerário Yanomami.
“Com pequenas variações regionais dentro da Terra Indígena Yanomami, o ritual funerário de um parente começa com pranto coletivo, seguido da cremação do cadáver, momento em que os componentes imateriais da pessoa se libertam do corpo físico. O pranto acompanha esse processo e se repete todas as tardinhas por dias ou semanas. Os ossos carbonizados são recolhidos, triturados e cuidadosamente guardados em cabaças seladas com cera. Algum tempo depois, começam os preparativos para a grande cerimônia em homenagem ao morto. Congregando várias comunidades vizinhas e até mesmo distantes, anfitriões e convidados desempenham as diversas fases da cerimônia que dura mais de uma semana, incluindo cantos, danças, sessões xamanísticas e o que chamamos de diálogos cerimoniais. No último dia, o mais solene, os ossos do morto são pulverizados, adicionados a mingau de banana e ingeridos pelos parentes mais próximos.”
Alcida Ramos faz um paralelo entre o ritual Yanomami e a comunhão nas missas da Igreja Católica. “Todas as semanas milhares e milhares de fiéis católicos ingerem grandes quantidades de hóstias, bolachas de pão sacralizadas para representar o corpo de Jesus Cristo. É um ritual de incorporação de quem está morto, não importa há quanto tempo. Quem ousaria chamar essa prática de canibalismo? Em que ela difere do rito funerário Yanomami? […] Assim como a hóstia cristã incorpora a memória do Cristo entre os vivos e os torna mais cristãos, também as cinzas do parente Yanomami transmitem a sua essência aos vivos e os tornam mais fortes. É a manifestação máxima de solidariedade humana, capaz de superar a própria morte quando une um morto aos seus parentes vivos. Ao mesmo tempo, a incorporação material do morto libera seus componentes imateriais para seguirem o seu próprio destino pós-morte, desprendendo-o definitivamente do mundo dos vivos.”
A professora disse que “a sutileza, o respeito e a grandeza dos ritos mortuários dos Yanomami contrastam cruamente com as tolices perversas e constrangedoras que circulam nas redes sociais, escancarando a palermice e a má-fé que ninguém merece ver, muito menos os povos indígenas e o Brasil como país pluriétnico que é”.
O vídeo que viralizou nesta semana nas redes sociais foi gravado em 2016 e foi extraído de um vídeo mais longo postado naquele mesmo ano pelo próprio Bolsonaro em seu canal no YouTube. Trata-se, segundo Bolsonaro, de uma entrevista ao jornal “The New York Times”.
No vídeo, Bolsonaro aparece se gabando de ter coragem de quase ter “comido um índio”. Segundo ele, o fato se passou em Surucucu, uma das principais comunidades da Terra Indígena Yanomami.
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