Governo de Pequim e países da região devem bloquera compra de produtos japoneses
Original da BBC
O início do despejo das águas residuais da central nuclear de Fukushima no Oceano Pacífico pelo Japão está causando grande controvérsia na região. Vários países vizinhos expressaram a sua insatisfação com a medida – mas a China foi ainda mais longe e decidiu retaliar.
O governo de Pequim é o principal comprador de frutos do mar do Japão e disse nesta quinta-feira (24) que bloqueará as importações desses produtos para o país. O governo de Tóquio tem insistido que a água não representa qualquer risco para os ecossistemas, algo com que muitos cientistas concordam.
Até a Agência Internacional de Energia Atômica, ligada à ONU, aprovou o plano de despejo do esgoto da usina seriamente danificada por um tsunami em 2011.
Mas os críticos da medida têm sido claros, salientando que é necessário realizar mais estudos e que o despejo deve ser interrompido.
Estima-se que perto de um milhão de toneladas de água, que estava armazenada em tanques dentro da usina, serão despejadas no oceano nos próximos 30 anos.
A China, que tem sido o país que mais se opôs à medida desde que o plano do Japão foi anunciado há dois anos, classificou a decisão do governo japonês como “extremamente egoísta e um ato de irresponsabilidade” e indicou que está “herdando uma ferida aberta para as futuras gerações da humanidade”.
Depois de emitir a declaração, a alfândega da China anunciou que a proibição que existia sobre a importação de frutos do mar da região japonesa de Fukushima e de outras províncias próximas foi agora imediatamente estendida a todos os frutos do mar vindos do Japão “para proteger a saúde dos consumidores chineses”.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_59edd422c0c84a879bd37670ae4f538a/internal_photos/bs/2022/u/j/yQcBGEQYCN031wFP4dNQ/62459060-906.jpg)
Essa medida foi calculada para prejudicar a economia japonesa e até Tóquio admitiu que as empresas dedicadas a esta indústria devem ser prejudicadas.
China e Hong Kong importam, em conjunto, mais de 1,1 bilhão de dólares em produtos marinhos do Japão todos os anos. Isso equivale à metade das exportações desse item para a economia japonesa.
Uma relação conflituosa
Analistas afirmam, porém, que há mais fatores motivadores da decisão chinesa do que apenas as dúvidas envolvendo Fukushima.
A relação entre Tóquio e Pequim vem passando por momentos difíceis nos últimos anos, aproximando o Japão dos Estados Unidos e até levando o país a mostrar apoio a Taiwan, uma ilha que a China reivindica como sua.
“Este incidente é muito mais um sintoma do que uma causa do agravamento das relações entre os dois países”, diz Neil Thomas, especialista em política internacional do Asia Society Policy Institute, à BBC.
“Pequim poderia ter protestado muito menos sobre esta questão da água se a sua relação com Tóquio estivesse em melhor estado”, disse ele.
Por sua vez, em resposta, o Japão “rejeitará as críticas ao seu plano, mas não fará nada provocativo”, prevê James DJ Brown, professor especializado em política internacional japonesa na Temple University.
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“É verdade que Tóquio está preocupada com o que vê como uma série de ações agressivas por parte do governo chinês, mas entende que precisa e está interessada em manter uma relação estável com o seu vizinho”, observa.
Mas não será necessário esperar muito. Alguns observadores acreditam que a China não manterá a proibição por muito tempo.
“As dificuldades de crescimento econômico da China significam que qualquer proibição é curta e limitada, a fim de mitigar o efeito que pode ter sobre os importadores e aqueles próximos a estas empresas”, disse Thomas.
A Coreia do Sul também proíbe há muito tempo alguns frutos do mar japoneses. Mas na quinta-feira, seu governo teve uma reação mais discreta do que a chinesa.
O primeiro-ministro Han Duck-soo disse que “o que é importante agora é que o Japão, conforme prometido à comunidade internacional, siga estritamente os padrões científicos e forneça informações de forma transparente”.
Seul e Tóquio, apesar das diferenças históricas, aproximaram-se nos últimos anos, sob o abrigo de uma aliança com os EUA, enquanto as ameaças da China e da Coreia do Norte continuam.
No entanto, muitos coreanos opõem-se ao despejo da água e nesta quinta-feira dezenas de manifestantes tentaram sair às ruas perto da embaixada japonesa para protestar contra a medida.
Além disso, mobilizações também ocorreram em Hong Kong e Tóquio.
Por sua vez, Mark Brown, chefe do Fórum das Ilhas do Pacífico que criticou ferozmente o plano de despejo, disse acreditar agora que ele atende aos padrões de segurança internacionais.
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Desde que o tsunami de 2011 destruiu a central nuclear de Fukushima, a empresa Tepco tem bombeado água para arrefecer os reatores da central.
Isso significa que a usina produz água contaminada, que é tratada e armazenada em tanques.
No entanto, mesmo após o tratamento, a água contém valores inaceitavelmente elevados de substâncias radioativas, como o trítio e o carbono-14, que são muito difíceis de remover.
O plano do Japão tem sido diluir essas águas tratadas com água do mar antes de despejá-las no oceano.
Mais de 1.000 tanques foram abastecidos e o governo japonês salienta que esta não é uma decisão sustentável a longo prazo. Também disse que após tratamento e diluição em água do mar é seguro despejar.
Muitos cientistas apoiaram o plano, dizendo que funciona. A Agência Internacional de Energia Atômica da ONU também disse que o plano atende aos padrões internacionais e teria um impacto “insignificante” no meio ambiente.
As autoridades japonesas prometeram monitorizar continuamente os níveis de radiação no oceano e manter um elevado nível de transparência. Mas há quem ainda esteja cético diante do histórico da Tepco: é a mesma empresa que foi acusada de falta de transparência durante o desastre de 2011. Desde então, a Tepco pediu desculpas pelo que aconteceu.
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