STF cria “lei” para amordaçar imprensa e responsabilizar veículos por fala de entrevistado

Supremo Tribunal Federal se arvora sobre competência do Congresso Nacional, que foi eleito para criar leis que regem o país, e abre precedente perigoso e antidemocrático de censura

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O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a avançar sobre a competência do Legislativo e aprovou, nesta quarta-feira (29), uma “tese” para responsabilizar veículos de comunicação civilmente por declarações feitas por entrevistados em reportagens jornalísticas.

A aberração jurídica amordaça perigosamente a liberdade de imprensa definindo que a empresa jornalística poderá ser punida pela Justiça se publicar matéria onde o entrevistado “acuse” alguém sobre a prática de um crime que não for comprovado posteriormente.

O STF deixa ainda um oceano de brechas para interpretações que poderão condenar os veículos de comunicação ao determinar que basta para punição, o Juiz entender que, por exemplo, à época da divulgação da entrevista, havia “indícios concretos” da falsidade da imputação ou o veículo deixou de observar o “dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios”.

A responsabilização envolve eventuais indenizações por danos morais. A “tese” foi sugerida pelo ministro Alexandre de Moraes que foi acompanhado  pelos demais ministros.

A gravidade da criação da nova “lei de mordaça à imprensa” é grande, já que o caso tem repercussão geral, é a “tese” deverá ser seguida por todas as instâncias da Justiça em processos do tipo.

A tese aprovada foi a seguinte:

  1. “A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia, admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas.
  2. Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (1) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (2) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios”.

Os ministros já haviam decido em agosto sobre a possibilidade de veículos terem a responsabilidade sobre declarações de entrevistados. Não houve, no entanto, uma proposta de tese geral que tivesse conseguido o apoio de uma maioria.

Na ocasião, se formaram três ideias: A de Edson Fachin, a de Alexandre de Moraes e a de Roberto Barroso. Cada um com sua forma de criar novas regras para punir os veículos de comunicação

Edson Fachin propôs que o veículo só poderia ser responsabilizado se houver reprodução da acusação falsa sem ter procurado a verdade objetiva ou dado espaço para direito de resposta ao ofendido. A tese formulada foi a seguinte:

“Somente é devida indenização por dano moral pela empresa jornalística quando, sem aplicar protocolos de busca pela verdade objetiva e sem propiciar oportunidade ao direito de resposta, reproduz unilateralmente acusação contra ex-dissidente político, imputando-lhe crime praticado durante regime de exceção.”.

Alexandre de Moraes havia defendido que não deve haver censura prévia, mas que é admitida possibilidade posterior de análise da responsabilidade sobre as informações divulgadas. A tese inicialmente proposta pelo magistrado foi a seguinte:

“A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, não permitindo qualquer espécie de censura prévia, porém admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas.”

Já Roberto Barroso havia votado para validar a responsabilidade pelo veículo de comunicação se, na época da publicação, existiam indícios concretos de que a informação era falsa ou se o veículo “deixou de observar o dever de cuidado na verificação” dos fatos.

A tese formulada pelo magistrado era a seguinte:

“Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios.”

O caso concreto analisado tratou de uma disputa do ex-deputado federal Ricardo Zarattini Filho contra o jornal “Diário de Pernambuco”.

Ele pediu indenização por danos morais porque o veículo publicou entrevista, em 1995, em que Zarattini foi acusado de participar de um ataque a bomba em 1966 no Aeroporto de Guararapes, no Recife.

Antes dessa nova “tese” que na prática é a criação de uma nova “Lei”, de acordo com a Constituição, apenas o entrevistado era responsabilizado por suas declarações.

Com a nova lei, veículos de comunicação ficarão impedidos de publicarem denúncias, já essas denúncias podem ou não serem comprovadas.

O caso que gerou a tese veio de recurso à decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que em 2016 condenou a empresa jornalística Diário de Pernambuco S.A. a indenizar o ex-deputado federal Ricardo Zarattini Filho, morto em 2017,  por danos morais decorrentes de matéria publicada no periódico.

Em 1995, o jornal publicou entrevista de um líder político de Pernambuco, do período do regime militar, que responsabilizou Zarattini pela explosão de uma bomba no aeroporto de Recife, em 25 de julho de 1966. O atentado deixou duas pessoas mortas e 14 feridas.

Zarattini que era militante de esquerda naquela época, foi inocentado de todas as acusações, ainda na década de 80. Na ação de indenização, o ex-deputado alegou que a entrevista, desprovida de qualquer atualidade, ofendeu sua honra.

O juízo de primeiro grau julgou a pretensão procedente e condenou o Diário de Pernambuco a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 700 mil. O Tribunal de Justiça, no entanto, reverteu a decisão e considerou o pedido de Zarattini improcedente, o que levou a um recurso no STJ e posterior ao STF.

O nascimento do caso

Há quase 60 anos, durante a ditadura militar, a cidade do Recife, capital de Pernambuco foi palco de diversos atentados todos atribuídos à esquerda. A maior parte deles não provocou muitos estragos, mas o do dia 25 de julho de 1966, entrou para a história, quando  uma bomba explodiu no saguão do Aeroporto dos Guararapes, matando duas pessoas e ferindo outras 14.

Mais de meio século depois, o episódio segue sem elucidação, com autores não identificados.

A decisão desta quarta-feira no Supremo foi sobre a ação na qual o ex-deputado federal Ricardo Zarattini Filho processou o jornal Diário de Pernambuco por danos morais, em função dareportagem publicada em 1995.

Na matéria jornalística, o político pernambucano Wandenkolk Wanderley afirmou que Zarattini, morto em 2017, foi responsável pelo atentado a bomba no aeroporto de Recife, em 1966, durante a ditadura militar.

Ao recorrer à Justiça, a defesa de Ricardo Zarattini disse que Wandenkolk fez acusações falsas e a divulgação da entrevista gerou grave dano à sua honra. Segundo ele, o jornal reproduziu afirmação falsa contra ele e o apresentou à opinião pública como criminoso.

Diário de Pernambuco alegou no processo que a publicação da entrevista se deu no âmbito da liberdade de imprensa, protegida pela Constituição.

O jornal foi condenado pela primeira instância ao pagamento de indenização de R$ 700 mil. Em seguida, o Tribunal de Justiça de Pernambuco anulou a condenação do jornal e entendeu que o periódico apenas reproduziu as falas de Wandenkolk Wanderley e não fez qualquer acusação a Zarattini. Depois o STJ  revalidou a condenação e reduziu a indenização para R$50 mil e o jornal recorreu ao STF, que criou a nova “tese” com repercussão geral.

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