Associação Moriá e as emendas milionárias: quem são os deputados, quanto destinaram e o que está em jogo
A ONG Associação Moriá, com sede registrada em Brasília, é alvo de investigação após declarações falsas sobre o alcance de seus projetos e o recebimento de mais de R$ 53 milhões em emendas parlamentares nos últimos dois anos. A entidade afirmou ter atendido 3,5 milhões de jovens em Anápolis (GO), cidade que conta oficialmente com 398 mil habitantes, segundo o IBGE.
A incoerência nos números e a suspeita de superfaturamento nos contratos levaram o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), a determinar que o governo federal, o Congresso Nacional e a Controladoria-Geral da União (CGU) prestem esclarecimentos sobre os repasses à entidade.
Conforme os dados detalhados do Censo Demográfico 2022 para Anápolis (GO), obtidos via IBGE e análise especializada, temos o seguinte panorama populacional da faixa etária considerada “jovem” (15 a 29 anos):
15 a 19 anos: aproximadamente 16.289 pessoas
20 a 24 anos: aproximadamente 16.270 pessoas
25 a 29 anos: aproximadamente 16.270 pessoas
Somando essas faixas etárias, o total estimado de jovens entre 15 e 29 anos em Anápolis é de cerca de 48.829 pessoas.
Os parlamentares que mais destinaram recursos à Moriá
A seguir, a lista dos principais autores das emendas que beneficiaram a Moriá, de acordo com documento oficial incluído no despacho de Dino:
Fred Linhares (Republicanos-DF) – R$ 27,6 milhões
Izalci Lucas (PL-DF) – R$ 15,5 milhões
Bia Kicis (PL-DF) – R$ 1,5 milhão
Julio Cesar Ribeiro (Republicanos-DF) – R$ 800 mil
Paula Belmonte (Cidadania-DF) – R$ 500 mil
A soma dessas cinco emendas corresponde a mais de 90% dos recursos recebidos pela ONG nos anos de 2023 e 2024. A maioria foi destinada para projetos de “educação digital”, com foco na formação de jovens em jogos eletrônicos como Free Fire, Valorant e League of Legends, dentro do programa denominado JEDIS – Jogos Estudantis Digitais.
Irregularidades identificadas
Relatórios preliminares da Controladoria-Geral da União (CGU) apontam diversas falhas na execução dos convênios firmados entre a Moriá e órgãos públicos:
Ausência de sede funcional: a suposta sede da ONG em Brasília estava desocupada e sem identificação.
Equipe técnica sem qualificação compatível: a diretoria da ONG inclui um ex-militar como presidente, uma esteticista como diretora de operações, e um motorista como diretor administrativo.
Superfaturamento de equipamentos: a entidade alugou computadores por até R$ 35 mil a unidade — valor até 11 vezes acima do preço de mercado.
Gasto excessivo com eventos: cerca de 40% das verbas foram usadas em festas de abertura e encerramento dos jogos digitais.
Relatórios inflados: o caso mais evidente foi a declaração de que 3,5 milhões de jovens foram atendidos em Anápolis, número flagrantemente incompatível com a demografia local.
A CGU estima que pelo menos R$ 1,7 milhão tenham sido gastos de forma “evitável” ou irregular em apenas dois dos convênios analisados. A auditoria completa dos repasses deve ser concluída até 31 de outubro de 2025.
Reações e consequências
O escândalo ganhou repercussão nacional. O ministro Flávio Dino, do STF, deu prazo de 15 dias para que a Advocacia-Geral da União, a Câmara dos Deputados e o Senado expliquem como os recursos foram aprovados e repassados à entidade, sem fiscalização adequada.
Dino chegou a determinar a inclusão da Moriá nos cadastros de entidades inidôneas (CEIS e CEPIM), mas revogou a medida após a ONG corrigir seu portal da transparência e inserir documentos ausentes. Mesmo assim, o processo de apuração segue em curso.
Segundo fontes da CGU, há indícios de que a Moriá foi utilizada como “ONG de prateleira” para execução de emendas de forma terceirizada e possivelmente fraudulenta.
A Associação Moriá tornou-se símbolo de uma prática que tem preocupado órgãos de controle: o uso de emendas parlamentares para repasses vultosos a organizações com pouca ou nenhuma estrutura, sem licitação, fiscalização ou controle efetivo.
Apesar das correções superficiais promovidas pela entidade, os indícios de fraude e má gestão permanecem sob análise. O caso coloca sob escrutínio não apenas a ONG, mas os parlamentares que viabilizaram os recursos, especialmente Fred Linhares e Izalci Lucas, que juntos responderam por mais de R$ 43 milhões dos valores destinados à Moriá.
As investigações seguem e podem resultar em responsabilizações civis, administrativas e penais tanto para os dirigentes da ONG quanto para os autores das emendas.

