Descontentamento internacional com os custos do serviço ofertado gerou debates acalorados no encontro da Convenção do Clima das Nações Unidas, em Bonn, na Alemanha
Belém (PA) – A cidade de Belém, capital do Pará, enfrenta uma série de dificuldades estruturais e logísticas para sediar a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), marcada para ocorrer entre os dias 10 e 21 de novembro de 2025.
As negociações preparatórias para a COP30, no mês passado em Bonn, na Alemanha, estão marcadas por impasses relacionados à falta de financiamento climático.
A menos de cinco meses da conferência principal, que será realizada em novembro, em Belém (PA), países alertam que sem recursos adequados será inviável implementar as metas acordadas nas últimas edições do encontro. O que pode transformar a COP30 em fracasso.
Além disso, com expectativa de receber entre 50 mil e 60 mil participantes de todo o mundo, a cidade ainda não conseguiu garantir a infraestrutura mínima necessária para acolher os visitantes, levantar acomodações e assegurar serviços básicos.

O maior problema até o momento é a hospedagem. Belém iniciou os preparativos com cerca de 18 mil leitos disponíveis. Mesmo com iniciativas para ampliar a rede para aproximadamente 36 mil leitos, ainda há um déficit de, no mínimo, 14 mil acomodações. Segundo dados divulgados pelo governo federal, a cidade conta atualmente com 14 mil leitos em hotéis tradicionais, cerca de 15 mil em imóveis de temporada, além de 6 mil previstos em cruzeiros atracados e aproximadamente 9 mil em alternativas como escolas adaptadas, quartéis, ferries, motéis e casas comunitárias.
Delegações estrangeiras manifestaram preocupação com a falta de estrutura hoteleira em Belém para receber os milhares de participantes esperados. Sem uma solução viável, há risco de ausência de representações de alguns países, o que pode esvaziar o evento.
Além da escassez de vagas, os preços exorbitantes causam indignação. Delegações estrangeiras relatam que algumas hospedagens cobraram até R$ 2 milhões por 11 dias de estadia, com diárias superiores a R$ 25 mil. A ONU recomenda um valor máximo de US$ 145 por diária (cerca de R$ 780), mas há registros de ofertas que superam US$ 9 mil por noite. Países como Alemanha, Noruega e Reino Unido já expressaram formalmente preocupação ao Itamaraty, e há rumores de que a sede da conferência poderia ser transferida caso a situação não se normalize nas próximas semanas.
Como resposta, o governo tem adotado medidas improvisadas. Além dos navios de cruzeiro, serão utilizados motéis, colégios públicos reformados, tendas climatizadas, contêineres e alojamentos militares. A Bnetwork, empresa contratada para intermediar as reservas oficiais, lançou uma plataforma com apenas 6 mil leitos disponíveis inicialmente, gerando críticas pelo atraso e pela limitação da ferramenta. A meta é adicionar mais leitos semanalmente, embora o prazo esteja apertado.
No campo da infraestrutura urbana, os desafios não são menores. Apenas 2,7% da população da região metropolitana de Belém tem acesso à rede de esgoto, segundo dados do Instituto Trata Brasil. O investimento médio anual em saneamento básico na capital paraense é de R$ 37 por habitante, bem abaixo da média nacional, que gira em torno de R$ 110.
Apesar de o governo federal já ter anunciado R$ 4,7 bilhões em investimentos para obras de mobilidade urbana, drenagem, saneamento e reforma de equipamentos públicos, há críticas sobre o foco exclusivo em áreas centrais, em detrimento de comunidades periféricas e ribeirinhas. Estima-se que a região metropolitana tenha um déficit habitacional de 84 mil domicílios. Moradores de áreas como a Vila da Barca, uma das maiores palafitas urbanas do país, relataram que obras próximas têm causado alagamentos e despejo de lama, o que compromete ainda mais a qualidade de vida local.
Diversos movimentos sociais, indígenas, quilombolas e ribeirinhos denunciam exclusão do processo de organização do evento. Segundo eles, o protagonismo das populações amazônicas está sendo suprimido por uma agenda voltada ao marketing ambiental, com pouca efetividade social. Eles exigem inclusão real nas decisões e alertam para o risco de a conferência representar um “espetáculo esvaziado” em vez de um marco de justiça climática.
A COP30 será a primeira realizada na Amazônia. Para o Brasil, é uma oportunidade histórica de demonstrar compromisso com o meio ambiente e com o protagonismo do Sul Global. No entanto, os gargalos de estrutura e a especulação em torno da hospedagem colocam em xeque a viabilidade do evento em sua atual sede.
O governo federal insiste que conseguirá entregar tudo dentro do prazo e que nenhuma possibilidade de mudança de cidade está em pauta oficialmente. Ainda assim, representantes da ONU acompanham de perto a situação e cobram soluções imediatas. Caso as falhas não sejam corrigidas, o Brasil poderá passar vexame internacional justamente no evento que prometia reposicionar sua liderança ambiental no cenário global.

