Maior levantamento randomizado sobre o medicamento atestou que não houve diferença significante nos índices de casos graves ou internações ou mortes entre quem utilizou hidroxicloroquina e quem recebeu placebo.
Um estudo brasileiro com a participação de 1,3 mil pacientes publicado no último dia 31 de março na revista britânica The Lancet apontou ineficácia da hidroxicloroquina para evitar internações ou casos graves da Covid-19.
Maior pesquisa randomizada sobre o medicamento, o levantamento foi realizado entre 12 de maio de 2020 e 7 de julho de 2021 e é assinado por 40 pesquisadores e pelo grupo Coalisão Covid-19 Brasil, sob coordenação de Álvaro Avezum, professor da pós-graduação da Universidade de São Paulo (USP).
Um dos autores, o cardiologista Joaquim Raposo aponta a maior amostragem como um dos diferenciais do trabalho.
“Havia outros estudos anteriores, mas sem tanto poder estatístico, que tinham um número menor de pacientes randomizados. A ideia foi mesmo mesmo fazer um estudo que tivesse um poder estatístico de dar uma resposta definitiva”, explica o médico, que dirige o Hospital de Cordeirópolis (SP), uma das 56 instituições participantes, entre hospitais, universidades e centros de pesquisas, incluindo o Hospital Israelita Albert Einstein e o Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
O critério de inclusão no estudo foi o diagnóstico positivo para Covid-19 com quadro leve ou moderado, diagnosticados até o sétimo dia por teste PCR ou de antígeno, além da presença de ao menos um fator de risco, como hipertensão, diabetes, asma ou obesidade. Metade dos pacientes participantes recebeu a hidroxicloroquina e metade um placebo, que não possui qualquer efeito medicinal.
Faixa etária: entre 36 e 56 anos
Mulheres: 729 pacientes
Homens: 623 pacientes
Quadros de obesidade: 752 pacientes
Quadros de hiptertensão: 732 pacientes
Quadros de diabetes: 222 pacientes
“O número total de eventos adversos foi de 27,6% no grupo hidroxicloroquina e 26,1% no grupo placebo; enquanto as proporções de eventos adversos graves de 30 dias foram de 5,7% e 7,3% no grupo hidroxicloroquina e no grupo placebo, respectivamente”, diz trecho do artigo, na apresentação dos resultados.
Segundo Raposo, o estudo também não detectou efeitos colaterais de relevância associados à hidroxicloroquina nos quadros estudados.
“O estudo exigiu um eletrocardiograma para detectar alterações que pudessem fazer com que o uso da cloroquina aumentasse o número de arritmias, mas não foi detectado nenhum grande efeito colateral, que são arritmias e retinopatia”, explica.
A pesquisa aponta que todas as mortes ocorreram durante a hospitalização devido à gravidade progressiva do Covid-19 e que não houve arritmias cardíacas graves, morte súbita ou retinopatia em ambos os grupos.
“Não reduziu a incidência de casos graves e não teve significância em piora de asma, em outros quadros que foram avaliados também: asmas grave, dias de febre, presença de falta de ar, pneumonia, otite, ventilação mecânica e morte. Em todos este itens, não houve diferença significante entre hidroxicloroquina e placebo. Morte é o desfecho mais relevante que existe e não houve redução de mortalidade também”, destacou o cardiologista.
Raposo explica que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acompanhou os trabalhos desde o início e relatórios parciais foram enviados ao órgão.
“Ela recomendou um número até um pouco maior [de pacientes participantes] para aumentar o poder estatístico do estudo. Junto com outros estudos menores, que vem sendo publicados, a partir de janeiro de 2022, o Ministério da Saúde não recomenda mais a hidroxicloroquina no tratamento rotineiro da Covid”, observa o médico.
“Na cardiologia, [a pesquisa] teve um impacto tremendo e a gente espera que quanto mais o tempo passe, mais os médicos tomem ciência do resultado e passem a utilizar essa conclusão do estudo”, completou o cardiologista.