Ministro do STF diz que sua decisão ligada à Lei Magnitsky não tem nada a ver com queda da Bolsa e debocha
Por Victório Dell Pyrro
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, saiu a campo nesta quarta-feira (20) para afirmar que sua polêmica decisão envolvendo a chamada Lei Magnitsky — instrumento jurídico usado pelos Estados Unidos para impor sanções a autoridades estrangeiras acusadas de corrupção ou violações de direitos humanos — nada teria a ver com a queda vertiginosa da Bolsa de Valores no início da semana.
A negativa, no entanto, soa mais como um malabarismo retórico do que como um esclarecimento técnico. Dino não saberia mesmo qual a extensão de suas decisões?
Dino chega ao extremo de afirmar que não sabia que era tão poderoso. Um deboche?
Na segunda-feira, Dino determinou que o Brasil não está obrigado a reconhecer nem a seguir “atos unilaterais de governos estrangeiros” em seu território, em resposta às sanções impostas pelos EUA contra o ministro Alexandre de Moraes, acusado em Washington de abusos contra a liberdade de expressão. A decisão, recheada de termos grandiloquentes e referências à soberania nacional, acabou interpretada por investidores e especialistas como uma reação defensiva contra a aplicação de penalidades internacionais, elevando o clima de incerteza jurídica. O mercado, sensível a qualquer sinal de instabilidade, despencou.
Diante da repercussão, Dino tenta agora pintar seu despacho como mera reafirmação de princípios constitucionais, negando qualquer correlação com o derretimento financeiro. O problema é que, enquanto o ministro joga com palavras, o efeito colateral de sua canetada já está dado: a insegurança sobre como o Brasil reagirá a sanções internacionais legítimas aumenta a percepção de risco, afasta capital estrangeiro e coloca o país em rota de colisão com uma das maiores potências econômicas do mundo.
Mais grave do que a queda da Bolsa é o recado diplomático: ao tentar blindar Moraes e enviar um gesto político doméstico, Dino produziu um “jabuti jurídico” que mexe com a credibilidade externa do Brasil. Ao ignorar o peso da Lei Magnitsky — que já atingiu figuras ligadas a ditaduras, oligarquias e esquemas de corrupção em diferentes países — o STF arrisca colocar o país no mesmo patamar de regimes que tentam relativizar sanções internacionais.
A versão oficial de Dino é que nada disso tem relação com Wall Street ou com o humor do mercado brasileiro. Mas, no subtexto, fica a marca de uma Suprema Corte que se comporta como arena política, disposta a tensionar com os EUA em nome de seus próprios membros.
Negar a conexão com o derretimento do mercado é como culpar a gravidade pela queda de um avião. Foi a própria decisão de Dino que acendeu o alerta vermelho entre investidores. Ao transformar o STF em bunker contra críticas externas, o ministro transmite a mensagem de que, no Brasil, não há instância que limite abusos de poder quando se trata de proteger os donos da caneta.
No fim, o ministro pode até negar o óbvio, mas não conseguirá apagar o fato de que sua decisão foi o estopim de um terremoto jurídico e econômico.
Mais do que um erro técnico, a canetada foi um gesto político mal disfarçado. Dino parece acreditar que, ao atacar a Lei Magnitsky, está resgatando a altivez nacional. Mas a comparação é cruel: em todo o mundo, essa legislação já puniu oligarcas russos, torturadores chineses e corruptos africanos. Aqui, ela virou apenas um espelho incômodo para mostrar até onde o STF está disposto a ir para defender um dos seus.

